11/21/2003

Loja de electrodomésticos VI

Baronesa em Brasa

Era uma baronesa de verdade.
Passavea-se de Bentley, conduzido por chauffer vestido a preceito, com chapéu da banda larga e luva branca, que ora e quando lhe saltava para o banco traseiro desfazendo-lhe o Ferrero Rocher entre as nádegas rosadas.

Tinha um caniche lãnzudo, uma colecção de chapéus que davam para 100 anos de corridas de Ascott e sapatos a perder de pé. Quase tantos como os que enfeitavam as unhas envernizadas e bafientas de Imelda Marcos.

Era uma baronesa austro-búlgara ou coisa que o valha.
Toda chique e chiclete. Antes de ser baronesa, foi putéfia de alterne em Praga.
Depois casou com um Tu Barão e logo se fez baronesa. Tinha amantes baronetes que lhe massajavam a púbis com as aristocráticas e viperinas línguas, e jardineiros que lhe regavam a vulva com longas e auríferas mangueiras.

Era uma baronesa das de verdade, Von Tripps para a "Caras", Mimi para os amigos da Quinta da Marinha.
Dava festas - bazares de caridades de louça da loja dos 300 e tijelinhas de arroz doce e pau de canela para os pobres, e bacanais de esplendor, regados a Moet&Chandon, pau de cabinda, caviar e coca para os ricos.

Como qualquer baronesa que se preze, andava sempre com uma permanente impecável, armadilhada a Laca Fiero que lhe conferia a proeminência de uma girafa com juba - Tal a consistência, o brilho, o glamour da aristocracia.

Todos os dias de manhã ia ao ginásio, tratar das pernas, e do que repousava entre elas com o seu massagista particular. Mais tarde era a vez do coiffeur, Jean-Dominique, um paneleirote afrancesado da Amadora, metido a artista de bóina basca do Quartier Latin.
Sentava-se religiosamente na mesma cadeira aveludada, sob o capacete secador que lhe soprava ar quentinho para os meticulosos rolos, a infestarem-lhe a carapaça loira como se fossem lêndeas platinadas no solário.

Ali ficava, a baronesa, fiambrando a "IOHLA" espanhola, comentando com risadinhas "histróinicas" os mexericos da moda.

Um dia, deu-se uma revolução anarco-operária, e levaram a pobre da baronesa para um cabeleireiro sombrio.
Sentaram-na numa cadeira metálica, colocaram-na sob um capacete secador, vendaram-lhe os olhos e ligaram a cadeira eléctrica, esturricando a baronesa, que nem chegou a perceber o que lhe acontecera, tão entretida estava com o artigo sobre a decapitação de Tadinha da Silva, publicado no panfleto anarco- bombista - "Penteado à Baioneta".

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