11/07/2006

História improvável das coisas - A banheira

Uma coisa é certa, se a banheira não tivesse sido inventada, provavelmente Marat ainda estaria vivo, gozando a reforma choruda que a Revolução francesa reserva para todos os seus filhos não decapitados.
Outra coisa é certa, a cantora Rita Lee provavelmente não teria vendido tantos discos já que não faria sentido "e só nós dois, numa banheira de espuma", se a banheira não tivesse sido inventada, e sem banheira a espuma seria também uma coisa que apenas coroaria as imperiais da Trindade e os dias de Boris Vian.
A importância da banheira para as sociedades industriais e para o cinema erótico só começou seriamente a ser investigada por P.T. Polyban, cientista norte-americano radicado no Alasca.
Corria o ano de 1898 e Polyban realizava um estudo sobre as rotas das invasões napoleónicas em períodos glaciares, quando subitamente ficou com o fogão a lenha do seu bungalow engripado, et pour cause, sem água quente para o banho e para o chá.
Com isto a sua banheira de pé alto perdeu o sentido da vida e iniciou uma espiral depressiva que a levou a várias tentativas de suicídio com a ingestão de enlatados de arenques em escabeche fora do prazo de validade importados de Peniche que, para quem não sabe, é uma terra pesqueira em Portugal de que Freud dizia - as mulheres têm inveja de Peniche.
Preocupado com a saúde mental da sua banheira e com o cheiro do seu sovaco, Polyban meteu ombros a uma investigação que seria determinante para o orgulho histórico da banheira e também para a história da higiene íntima.

Durante anos percorreu o mundo e visitou casas de banho nos locais mais recônditos, desde Salvaterra de Magos até à Pensão Vitória em Agadir, procurando pistas para encontrar a banheira original, ou seja, o momento na história em que o engenho humano fabricou um recipiente para se meter lá dentro nú e esfregara as virilhas com sabão azul.
No mar morto encontrou uns manuscritos a que não ligou peva, por lhe parecerem evangelhos, ou seja um tema batido, mas teve a sorte de conhecer Yuri Bidokov, considerado à época o segundo maior especialista em bidés e bechichés e o maior especialista em Proust, a seguir ao próprio, que há época ainda era vivo e continuava em busca do tempo perdido.
Quem não perdeu tempo foi Polyban que envenenou Bidokov com sais de banho, e lhe ficou com uma mala cheia de papéis que continham a morada de um místico hindú que sabia tudo sobre banhos, e também os planos secretos para uma revolucionária invenção que tornaria a banheira obsoleta.

Dois meses depois Polyban batia à porta de uma pira de paus de canela erguida na margem dos ganges, sobre a qual estava sentado Marabuta, o místico hindú, de pernas cruzadas à maneira dos eremitas, e a coçar vigorosamente os dedos dos pés, afectados por micoses.
Depois de obrigar Polyban a purificar-se nas águas do Ganges, Marabuta contou então a história da banheira original, que está contida na obra "O dia do primeiro banho, a humanidade lavadinha por baixo", que valeu a Polyban o reconhecimento da sociedade higiénica mundial, com sede em Basileia. A história era simples. Um chinês badalhoco, com aquafobia foi deportado pela dinastia Ming dentro de uma jarra para a costa sudoeste da Indía onde foi recolhido por um grupo de saltimbancos sikh.
Em tourné pelos palácios dos marajás, os saltimbancos eram obrigados a despiolharem-se nos lagos, antes de poderem meter pé nos palácios.
O chinês apátrida recusou-se a banhar-se nos lagos, por causa da sua religião. Carrancudo o guarda do Marajá mandou-o dar banho ao cão, e por tamanha blasfémia foi desmembrado do seu turbante, porque o marajá repeitava as religiões dos outros.

Homem culto e interessado por outras culturas, o marajá convidou o chinês Já Po Ban para tomar um duche com ele. Vieram dois criados e preparavam-se para os regar com uns funis de marfim. Mas o chinoca recusou-se a tomar banho nú com o marajá, porque desde as aulas de educação física em Xangai achava que tinha a pilinha pequenina, e por isso tinha vergonha.
Irado mas justo o marajá disse-lhe: Vais tomar banho comigo, e se o duche não te serve diz-me tu como iremos tomar banho juntos. Se não, o teu corpo vai tomar uma banhoca no Ganges e dar de comer aos crocodilos.
Com este ultimato, o chinoca não teve outro remédio senão pedir emprestadas duas enormes caldeiras das cozinhas do marajá, cheias de água previamente aquecida. Quando os corpulentos criados da copa chegaram ao jardim com os fumegantes tachos, o marajá perguntou - Vamos fazer sopa? Não sabes que o canibalismo foi abolido há 35 anos?
- Por quem sois meu caro marajá, vamos tomar os dois um banho de imersão em água quente neste banheira.
Assim reza a história de Polyban, nos jardins do marajá de Jaipur, foi tomado o primeiro banho de água quente da história, e nascia a banheira onde Marat encontraria a morte e Arquimedes ou lá como é que se chama o grego, encontraria inspiração para umas leis da física.
Quanto a Polyban, ficaria um homem rico e lavadinho, porque substituiu a banheira-depressiva da sua cabana por um revolucionário sistema de duche em casa, roubado da pasta de Bidokov, a que deu evidentemente o seu próprio nome.

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